Brasil x Haiti: do jogo da paz ao jogo da pacificação – PARTE 3

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Essa é a terceira reportagem de uma série de cinco sobre a relação entre Brasil e Haiti desde a implantação da Missão das Nações Unidas de Estabilização do Haiti (MINUSTAH), em 2004.

Por Miriane Peregrino

A família Gege aguardou sem entusiasmo as eleições no Haiti.  Fonds Parisien, Haiti.  Foto: Miriane Peregrino
A família Gege aguardou sem entusiasmo as eleições no Haiti. Fonds Parisien, Haiti.
Foto: Miriane Peregrino

Haiti: Eleições 2015

A família Gege é proprietária de uma mercearia na beira da estrada que liga Fonds Parisien ao Posto de Malpasso, fronteira com a República Dominicana. O estabelecimento permanece aberto até umas 22h com a luz dos carros da estrada e querosene iluminando o local. O fornecimento de energia elétrica é problemático em todo país. Água encanada é um luxo de poucas casas. O meio de transporte mais comum para a grande massa camponesa haitiana é as próprias pernas e o tap-tap, que lembra os pau-de-arara no nordeste brasileiro.

O Sr. Gege desacredita no processo eleitoral como via de mudança para o país: “Todo mundo quer que o Haiti melhore, mas eu não vejo melhorando. Aqui há milhares de candidatos pra todos os cargos.”

O voto no Haiti não é obrigatório e o jovem Polgens, filho de Gege, afirma que não comparecerá às urnas: “Tem muito candidato a presidente, todo mundo quer ser presidente só que tudo é um bando de ladrão. Os candidatos que querem trabalhar pelo Haiti são minoria e é difícil conhecê-los, é difícil saber quem quer trabalhar pelo Haiti mesmo. Isso faz com que eu fique neutro porque é muito difícil saber quem vai fazer realmente o que diz.”

 

Divulgação
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Veríssimo Antonio Mendes Júnior, coordenador da Brigada Dessalines implantada em 2009 no Haiti através da via campesina internacional, relacionou a questão agrícola e o processo eleitoral:

“Cerca de 70% dos haitianos são camponeses e importam 60% do que come, principalmente o arroz, o arroz dos Estados Unidos. Por causa dos subsídios que o governo dá ao produto americano, o arroz deles sai mais barato do que o arroz haitiano”.

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Feira Agricola mostra a produção alimentar haitiana. A imagem contraria a difusão da grande mídia de que a população sobrevive do “biscoito da terra” feito de terra, água, sal e manteiga, exposto em 2004 no Museu Naval, no Rio de Janeiro, em comemoração aos 10 anos da Minustah. Apesar da pressão internacional, os camponeses haitianos não pararam sua produção e estão em luta por autonomia, Jacmel, Haiti. Foto: Miriane Peregrino

Veríssimo continua: “A Monsanto tentou em 2010, após o terremoto, implementar produtos transgênicos, mas os movimentos sociais haitianos pegaram a carga de 10 toneladas de milho e queimaram. Atualmente, a Embrapa do Brasil está trabalhando um projeto para implementar uma variedade de mandioca. A Embrapa tem uma fazenda de 110 hectares no Haiti. O lema do atual presidente haitiano é ‘HAITI ABERTO AOS NEGÓCIOS’. Muitas empresas financiaram a campanha do atual presidente haitiano e isso sempre requer algo em troca. A maioria das terras do norte pertencem ao governo mas há muitos camponeses lá e eles estão sendo desalojados. Estão implantando monocultivo. A família Clinton mesmo tem uma grande quantidade de terras no Haiti”.

Via Campesina Internacional organiza apoio aos camponeses haitianos. Foto: Acervo Brigada Dessalines/MST
Via Campesina Internacional organiza apoio aos camponeses haitianos. Foto: Acervo Brigada Dessalines/MST

 O brasileiro Niltinho também participa da Brigada Dessalines e afirma: “Não estamos no Haiti para dizer o que os hatianos tem que fazer, mas para ouvir no que eles querem que a gente ajude”.

A Brigada Dessalines faz uma homenagem ao ex-escravo e revolucionário Jean-Jacques Dessalines (1758 –  1806), um dos líderes da revolução da independência e abolição da escravidão do Haiti.

No último dia 10 de agosto, foi realizado o primeiro turno das eleições parlamentares do Haiti e que deverão se estender até dezembro, tendo em vista que todo o processo eleitoral no país está atrasado a pelo menos 3 anos. O pleito terminou com 3 mortes, 130 detidos e o comparecimento de apenas 15% da população às urnas.

*Fonte: Curso de Comunicação Popular do Núcleo Piratininga de Comunicação 2015 – Vozes das Comunidades

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