Tradicional Arraiá da Paz volta ao Parque União

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Por Ana Cristina da Silva

No dia 4 de junho, a paróquia Nossa Senhora da Paz, localizada no Parque União, trouxe de volta uma das festas juninas mais conhecidas dentro do Conjunto de Favelas da Maré. O Arraiá da Paz, também conhecido como “Festa Junina do Terreno”, retornou após dois anos de pandemia e, apesar de sofrer algumas alterações, manteve a proposta de movimentar os finais de semana de junho com uma tradição composta por muita música, dança e comidas típicas. Acontecendo sempre nos três primeiros finais de semana do mês, o Arraiá da Paz se encerrará na noite do próximo domingo, dia 19.

Apesar da paróquia manter a duração de três finais de semana e o horário que vai de 19h às 1h, o retorno pós-pandemia do arraiá foi pensado cuidadosamente. Sem a certeza de como seria a recepção do público, o Conselho Paroquial optou por uma redução no número de barracas e comidas dispostas no espaço, mantendo somente as atrações mais frequentadas nos anos anteriores, como, por exemplo, a barraca de pescaria que sempre foi um sucesso entre as crianças e, até mesmo, a barraca do Correio do Amor, que já resultou em alguns pedidos de casamento nos anos anteriores. Ajudando no evento, Jozinete Ferreira, de 54 anos, alega que todos achavam que muitas pessoas deixariam de ir devido a pandemia: “Ficamos dois anos fechados, então a gente lançou a festa e ficamos no escuro, mas as pessoas estavam ansiosas, muita gente perguntava. A gente não esperava a quantidade de pessoas que teve no primeiro final de semana. Nós ficamos surpresos pela quantidade de pessoas”.

Da esquerda para a direita, representando três gerações da Paróquia Nossa Senhora da Paz, estão: Jozinete Ferreira, Inesio Almeida, Josefa Fernandes e Nicolas Serejo. Foto: Ana Cristina da Silva.

Quadrilhas

Apesar de já existir festas juninas que misturam diferentes estilos, o Arraiá da Paz mantém a tradição ao apresentar suas quadrilhas com roupas caipiras, coloridas e vibrantes, onde damas e cavalheiros dançam em pares e apresentam coreografias famosas ao lado de personagens bem conhecidos, como os noivos que aparecem vestidos de branco. A música que reverbera pelo espaço vai do forró ao baião, ao som de instrumentos como a viola, a sanfona e o triângulo. Este ano, três das quatro quadrilhas retornaram para as festas de fim de semana: a quadrilha da terceira idade, formada pelo grupo Sorrir é Viver; a quadrilha dos jovens, também chamada de Quadrilha da Paz; e a quadrilha das crianças, composta por alunos da catequese com idade a partir dos 7 anos. No entanto, sempre no último dia de evento, é formada a quadrilha Cata-Cata, que junta todas as quadrilhas e até os visitantes para uma grande dança que encerra a noite.

A quadrilha das crianças é formada pela união das turmas de catequese que alegram o público do arraiá. Foto: Ana Cristina da Silva.

Formada pelo grupo de jovens da paróquia, a Quadrilha da Paz é a que exige mais tempo de dedicação. Suas coreografias são pensadas a partir de um determinado tema que dita o conceito da quadrilha. De acordo com Nicolas Serejo, um dos organizadores, tudo começa a ser pensado bem cedo para que não fique muito puxado. “O trabalho da comissão começa em dezembro, onde começamos a pensar e planejar. Em janeiro a gente começou a chamar as pessoas e em fevereiro começamos os ensaios”. O tema de 2019 foi “A busca pelo branco”, que contava a história de um mundo de cores onde o branco não existia. No decorrer da coreografia, essas cores descobriam que para o branco surgir, todas precisavam se unir. “Esse ano a gente tem outra história, um pouco mais tradicional, mas a gente introduziu uma narrativa dentro disso (…) a gente tá retornando e a gente quer trazer algo familiar para as pessoas, algo que recorde uma festa junina tradicional mesmo”, explica Nicolas, de 25 anos.

A Quadrilha da Paz foi assistida por um grande número de pessoas durante a noite de sábado. Foto: Ana Cristina da Silva.

A quadrilha Sorrir é Viver, formada pelo grupo da terceira idade, já se apresenta na igreja há 7 anos. Entre as apresentações, que sempre encantam o público, o grupo já trabalhou com diferentes temas culturais, dançando do forró ao carimbó e até mesmo apresentando a história dos cangaceiros mais famosos do Brasil, como Lampião e Maria Bonita. Quem organiza tudo por ali é a Jozinete, que também é mãe de Nicolas. “O meu trabalho com eles é esse, resgatar o sorriso, o próprio nome já diz. A gente vê que a terceira idade são pessoas que geralmente se fecham no seu mundo, que tem todo um comprometimento quando o envelhecimento acontece e que se isolam ou são isoladas de seus familiares, então o grupo tenta resgatar isso, a alegria”, diz a moradora do Parque União. Tendo se apresentado no primeiro dia do Arraiá da Paz, o grupo Sorrir é Viver irá retornar para o último dia, no domingo.

Comidas e bebidas

Por mais que tenham reduzido o número de barracas este ano, ainda é possível encontrar mais de 15 variedades de comidas no Arraiá da Paz, como por exemplo: canjica, curau, tapioca, milho cozido, cachorro quente, batata frita e até os famosos caldos, que são os mais vendidos na festa. Enquanto isso, na barraca de bebidas é possível encontrar algo para cada gosto, como água, guaravita e refrigerante, mas também opções de bebidas alcoólicas como vinho, cerveja e caipifruta, sendo esta última a mais procurada. Os preços são acessíveis e as barracas se mantêm abertas até que tudo seja vendido.

O caldo de mocotó é um dos pratos vendidos na festa. Foto: Ana Cristina da Silva.

O dinheiro para comprar todo o material vem dos membros das pastorais, que também se dividem para preparar as comidas e trabalhar nas barracas, como a parte da caipifruta, que é comandada pela pastoral do batismo e a barraca de doces que fica por conta das legionárias. Ao todo, para que o arraiá aconteça, são cerca de 50 pessoas trabalhando, antes e durante os três finais de semana. Para Seu Idesio Almeida, que também integra o grupo Sorrir é Viver, apesar da festa exigir muito trabalho, a coletividade faz tudo acontecer: “As pastorais são muito unidas, sabe? A barraca que dá mais trabalho é a barraca da comida, porque a barraca é uma cozinha que serve pra outros tipos de evento. Então 70% da mão de obra da festa junina se concentra ali, mas o pessoal cai pra dentro”.

O grupo de legionárias da paróquia Nossa Senhora da Paz cuida da barraca de doces do arraiá. Foto: Ana Cristina da Silva.

História do Arraiá da Paz

Já fazem 14 anos desde o primeiro Arraiá da Paz, localizado na rua Guanabara, no Parque União. Porém, muito antes de transitarem para o atual espaço, a Paróquia Nossa Senhora da Paz já realizava as famosas e bem frequentadas festas juninas. O evento acontecia na rua da Paz, local onde ainda está situada a capela, e era coordenado pelas freiras e pelo padre atuante na época. “A festa junina aqui na Maré iniciou, vamos dizer assim, com a Paróquia Nossa Senhora da Paz, ela começou a motivar e a trabalhar essa questão de festa junina, ela é a mais tradicional por conta disso. Depois surgiu a Sagrada Família na Nova Holanda, mas a nossa é a primeira e depois, sucessivamente, vem as outras”, explica Jozinete. De acordo com ela, se forem somados todos os dias de festa, o Arraiá da Paz costuma receber mais de mil pessoas. Para Seu Inesio a festa é motivo de alegria: “É uma alegria ter uma festa junina que já vem há muitos anos na comunidade, que ficou 2 anos sem vir. É uma alegria muito grande ter a comunidade junta de novo”.

Conhecida por ser uma festa familiar, o Arraiá da Paz é realizado e frequentado por diferentes gerações. Os grupos jovens, que colaboram com o evento vão mudando, mas nunca deixam de frequentar a tradicional festa do Parque União, assim é com Jessica Ribeiro, de 26 anos, que frequenta a festa desde sua infância: “Antigamente eu vinha literalmente pra comer canjica, meu prato doce favorito. Lembro que eu vinha de casa, comprava e ia embora, todos os anos. Depois de um tempo eu entrei pra comunidade, comecei a participar de alguns grupos dentro da igreja, então não só pra comer, eu vinha trabalhar. Ajudava e ficava sempre na barraca do Correio do Amor”, relembra a moradora do Parque União que, mesmo estando um pouco afastada, adora frequentar a festa para ver todo mundo caracterizado e reencontrar com pessoas queridas. “Querendo ou não as pessoas acabam conhecendo, falando da festa umas pras outras e o pessoal aqui trata todo mundo muito bem, com muito carinho, de forma muito acolhedora, então acho que esse é o diferencial”. 

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