A re-invenção do CEASM e as suas novas frentes de luta
Colegiado CEASM
“A utopia está lá no horizonte….Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar” (Eduardo Galeano)
É exatamente isso que nos move: nossas lutas e nossos sonhos, ou seja, as utopias. Utopia, essa palavra de origem grega, que tem como significado “o lugar ideal”, e que nos inspira a seguir lutando e realizando, todos os dias, a idealização desse lugar. Há 23 anos é assim que o CEASM age; tecendo ações, reflexões, propostas de intervenção e mudanças no mundo em que está inserido. É na capacidade de ensinar, mas sobretudo de aprender, que seguimos nos reinventando na superação dos obstáculos e desafios que impedem a concretização do “Sonho CEASM”, da Utopia de realizar outro modelo de sociedade, que contemple outras formas de pensar, de existir, de sentir, de outra civilização. Seguimos reexistindo, na resistência cotidiana e urgente, já que não temos outra opção, pois é uma questão de sobrevivência: física, das memórias, dos saberes, das narrativas.
O Centro de Estudos e AÇÕES Solidárias da Maré está vivo, pulsante, um espaço da “esperança equilibrista”, que torna possível através das ações realizadas, há mais de duas décadas, mobilizar moradores da Maré e, também, de outros espaços da cidade nesse movimento de resgatar e retomar o papel social e político da instituição, de ser transformação. A ação do CEASM é fundamentalmente pedagógica, no sentido de propor um espaço potencializador de “leitura de mundo”, como propõe o grande Educador Paulo Freire. Nesse sentido, o CEASM é muito mais do que um “espaço físico no Morro do Timbau”. É a ideia, concepção de mudança, transformação social a partir do rotagonismo de todes que se somaram e se somam a esta utopia. É desta forma que o CEASM se re-inventou e re-inventa, através da energia insurgente, nos braços e vidas dos “sonhadores” que materializam as ações no chão do CEASM.
O marco histórico da re-invenção do CEASM se dá a partir de 2007, quando diferentes visões sobre a condução das ações da instituição se tornam inconciliáveis, gerando o rompimento do grupo que participou de sua criação. É neste contexto que emerge a exigência da autocrítica e retomada do papel político e social da instituição, sustentada por quem permaneceu construindo o CEASM.
Esse processo de retomada e re-invenção do CEASM – é imprescindível que se deixe registrado – somente foi possível porque em cada projeto da instituição havia o protagonismo de quem se disponibilizou e se envolveu com o propósito de levar adiante o sonho de uma sociedade que seja para todes. O CEASM se manteve de pé graças à energia e ao sonho militante de muitas vidas, que se dedicaram a concretizar um espaço potencializador de oportunidades no enfrentamento às estruturas de desigualdades histórico-sociais que marcam o cotidiano das periferias e das favelas, bem como o da nossa Maré.
Há um movimento de mudança que irradia de todos os projetos. As dificuldades materiais não foram capazes de engessar, de inviabilizar as ações realizadas por cada projeto que tiveram que contornar os diversos desafios que surgiram a partir de 2007, principalmente na superação das questões de ordem econômica, tendo em vista a pouca disponibilidade de recursos financeiros para a execução das atividades.
Quanta gente passou pelos projetos do CEASM e, a partir da formação política e humana, está atuando em várias frentes e realidades desse mundão. Vemos no cotidiano do CEASM, participando nos projetos, a presença de amigues que tiveram suas jornadas marcadas pela intervenção do CEASM em algum momento de suas vidas. É assim que nos re-inventamos, no retorno e envolvimento daqueles que querem continuar esse sonho e as nossas lutas. Estamos vivos e nos re-inventamos em cada um que se soma às lutas do CEASM, dedicando energia em cada projeto da instituição.
Vivos, em todes que estiveram e estão no Pré-Vestibular, que há mais de duas décadas contribui na democratização e universalização do acesso ao ensino superior. E o mais importante: realizando uma prática pedagógica alicerçada na pedagogia freireana, nas bases da educação popular. Uma educação em que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra” para que a formação humana seja a centralidade desse processo.
Vivos, em todes que estão no Curso Preparatório para o ensino médio, em um processo de formação e preparação não somente para a aprovação em escolas de ensino médio, mas preocupados na formação integral.
Vivos, em todes que fazem o jornal O Cidadão, belíssimo e combativo exemplo de comunicação popular e comunitária que rompe com a manipulação da informação pela “grande” mídia.
Vivos, em todes do Eco-Rede, que nos últimos anos realizou um trabalho imprescindível de formação no campo educacional para o meio-ambiente.
Vivos, na atuação de todes do Museu da Maré, que na sua origem, enquanto projeto “Rede de Memória”, se transformou e assumiu um lugar de protagonismo e referência na Museologia Social em nível mundial.
Vivos, no campo da pesquisa, ação política e formadora, no grupo que está retomando as atividades de produção de conhecimento acadêmico através do NEPS (Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais da Maré).
São mais de duas décadas, na Maré, reivindicando direitos, oportunidades, tornando o discurso coerente com a prática. A roda da história girou e o mundo mudou, impondo, trazendo novas lutas, e exigindo respostas para novas formas de “velhos” desafios. O CEASM se constituiu dentro do contexto histórico da década de 1990, marcada pela retomada das práticas e valores do Liberalismo na América Latina. E hoje, após duas décadas re-existindo e presenciando conquistas e derrotas, estamos celebrando 23 anos de resistência, mas principalmente de inventividade e criação de novas tecnologias sociais, especialmente agora, diante do cenário da pior pandemia da história da humanidade, que agravou drasticamente as desigualdades sociais entre as camadas populares.
Seguimos dispostos a não recuar diante do negacionismo, do obscurantismo, da retirada de direitos, da ascensão da extrema-direita que tenta avançar em direção ao ultraliberalismo, da militarização da vida que criminaliza a vida dos moradores das favelas, dos empobrecidos pela lógica do grande capital. Seguimos reconhecendo a importância do protagonismo de todes que se dedicaram e se dedicam à concretização dos “nossos sonhos, nossas lutas”, tornando possível ao CEASM se re-inventar e permanecer vivo. Sigamos em frente embalados no trecho, abaixo, da letra do samba “Bandeira da Fé” de Martinho da vila e Zé catimba.
Pra lutar pelos nossos direitos,
Temos que organizar um mutirão
E abrir o nosso peito contra a lei
Do circo e pão
E ao mesmo tempo cantar, sambar, amar, curtir
Só assim tem validade minha gente
Esse nosso existir