Brasil x Haiti: do jogo da paz ao jogo da pacificação – PARTE 1
O Cidadão terá uma série de cinco reportagens sobre a relação entre Brasil e Haiti desde a implantação da Missão das Nações Unidas de Estabilização do Haiti (MINUSTAH), em 2004.
Miriane Peregrino
A Missão da ONU no Haiti
A mais recente intervenção direta dos Estados Unidos no Haiti ocorreu em 29 de fevereiro de 2004, quando o então presidente norte-americano George W. Bush anunciou que o presidente do Haiti, Jean-Bertrand Aristide, havia abandonado seu país e estava enviando soldados norte-americanos para lá. No seminário que ocorreu em maio deste ano, Miguel Borba de Sá, do Instituto Políticas Alternativas, afirmou que os EUA queria garantir a estabilidade de seus investimentos no país e desrespeitou todas as normas do direito internacional.
“Trata-se de um golpe de estado e os golpes de estado na América Latina não estão pertencentes ao passado, temos exemplos recentes como Paraguai, Honduras e a tentativa na Venezuela, em 2012, e o Haiti faz parte dessa história” – lembrou Borba de Sá – “A Minustah foi uma forma de legalizar, dar uma aparência jurídica legal para a ocupação militar que já tinha começado no Haiti após um golpe sobre um presidente democraticamente eleito”.
A brasileira Livia Bezerra morou no Haiti entre setembro de 2011 e setembro de 2012, quando era membro da Associação Brasileira dos Estudantes de Engenharia Florestal, uma das organizações que compõem a Via Campesina Brasil e que implantou Brigada de Solidariedade aos movimentos camponeses haitianos – a Brigada Dessalines. Segundo Lívia, a Minustah tem uma relação contraditória com o povo haitiano, pois estão lá “para reprimir as manifestações populares e desenvolvem pequenos projetos com ONGs para melhorar um pouco a sua imagem através do assistencialismo, que reina soberano na atuação internacional no Haiti”.
Lívia Bezerra questiona a necessidade do aparato bélico da Minustah em um país com baixímo índice de violência: “É impactante chegar num país onde a taxa de homicídios é menos que a metade da taxa do seu país, e há tanques dirigidos por seus compatriotas circulando ‘tranquilamente’ nas ruas. É impactante chegar na principal praça de uma capital de departamento e se ver cercado de barricadas, com soldados que não falam a língua dos transeuntes. É impactante ir a um jogo de futebol no interior no país e ser vigiado de perto por soldados em tanques.”
O haitiano Alix Georges, que atualmente mora no Rio Grande do Sul, relatou no seminário como foi a invasão norte-americana: “Eu estava no Haiti e eu vi o inferno no dia 29 de fevereiro no Haiti. Cortaram o telefone, cortaram luz, não tinha nenhum tipo de comunicação, ninguém podia circular. Muitos haitianos, de fato, não sabem o que aconteceu naquele dia. Há muitas informações e a gente não sabe o que aconteceu. Eu escutei por uma rádio da França que o presidente tinha deixado o país”.
Alix Georges, como todos os demais haitianos entrevistados, demonstra ter grande respeito e admiração pela história de seu país e afirma que não há coincidência no fato da invasão dos Estados Unidos ocorrer no ano em que o Haiti completou 200 anos de independência:
“Porque foi em 2004, o ano em que a missão foi pro Haiti? Porque em 2004 o Haiti estava prestes a festejar 200 anos de pais independente, como o 1° pais negro a ser independente do mundo! Isso é um orgulho pro haitiano e cada vez que a gente fala isso a gente paga por isso. Até hoje.”
Após a invasão norte-americana, o Conselho de Segurança das Nações Unidas, por meio da resolução 1.542 de abril de 2004, autorizou o envio de uma operação de manutenção da paz no Haiti. Em 1º de junho do mesmo ano, o Brasil assumiu a chefia da missão conhecida como Missão das Nações Unidas de Estabilização do Haiti (MINUSTAH).
Fonte: Curso de Comunicação Popular do Núcleo Piratininga de Comunicação 2015 – Vozes das Comunidades