Instituto Marielle Franco lança na Maré iniciativa Ocupa Marielle Franco
Por Carolina Vaz
Foto de capa: Ana Cristina da Silva
Na foto de capa, a diretora-executiva do Instituto Marielle Franco, Ligia Batista
O Instituto Marielle Franco (IMF) vem realizando a inauguração, em todas as regiões do país, do Ocupa Marielle Franco: espaços destinados a debate político neste período pré-eleições municipais. O objetivo é incentivar as candidaturas de mulheres negras para as prefeituras e Câmaras de Vereadores dos municípios. No último dia 03 de agosto, foi a vez do Rio de Janeiro de receber um Ocupa Marielle, e foi exatamente na Maré, favela de origem de Marielle, mais especificamente na Cozinha da Frente Maré, um espaço que é reflexo da militância mareense em prol da população.
O evento foi conduzido pela mobilizadora social e mareense Flavinha Cândido, e contou com a participação de representantes do Instituto, parlamentares, artes e mobilizadoras sociais de diversas favelas e campos de atuação. Anteriormente já haviam sido inaugurados os Ocupa Marielle Franco de Recife (CE), Cuiabá (MT), Macapá (AM), Curitiba (PR) e Niterói.
Logo no início, Flavinha expressou sua alegria por estar conduzindo o evento e exatamente naquele espaço: “Eu estou muito feliz por estar sendo aqui este Ocupa… para quem não sabe, esse aqui é o Salsa e Merengue e mais à frente fica a escola Marielle Franco. É uma escola bilíngue dentro de uma favela (…) A gente vê o quanto é importante o legado”.
Apoiar candidaturas representativas
Segundo Ligia Batista, diretora-executiva do Instituto Marielle Franco (IMF), fazer o Ocupa na Maré significa fortalecer o vínculo com o bairro de oregem de Marielle, e o projeto dos Ocupas é de combater a ausência das mulheres negras nos espaços de política. “Nós queremos construir uma outra fotografia do poder que permite ter mais vozes (…) a cara do povo, ter a cara da gente, para que a atual democracia seja desafiada”, afirmou. O trabalho de diálogo nas favelas, segundo Nathalia Carlos, vem de 2018, de quando Marielle ainda era vereadora. Ela é coordenadora de articulação política e territórios do IMF, e conta que uma parte das pessoas presentes, incluindo Flavinha, já havia se reunido com Marielle em março de 2018 para construir este sonho, de fazer um trabalho nas favelas, que foi interrompido com o assassinato de Marielle. Para ela, realizar o Ocupa na Maré é dar continuidade, multiplicar o legado de Marielle onde ela gostaria de realizar mobilização.
“O que a gente vai fazer aqui é desenvolver estratégias de mobilização, de articulação, chamar a população para debater a cidade (…) A gente quer convidar a sociedade para se mobilizar e eleger muitas mulheres negras no ano de 2024”. – Nathalia Carlos, coordenadora de articulação política e territórios do Instituto Marielle Franco
Ocupa na Cozinha Solidária
Um dos primeiros mareenses a falar foi Naldinho Lourenço, membro da Frente de Mobilização da Maré e um dos responsáveis pela Cozinha Comunitária. Ele comentou a origem da Frente Maré no início da pandemia de Covid-19, e deu ênfase à grande mobilização social ocorrida nos últimos anos: “Tem gente que diz: o que ela (Marielle) fez pela favela? As pessoas não entendem que é um contexto muito mais amplificado, muito maior, para que a gente consiga fazer mais e mais”.
Para Luyara Franco, filha de Marielle e diretora de legados do IMF, fazer o evento na Maré significa recuperar um lugar de ancestralidade para sua família, desde o seu bisavô que foi o quinto morador da Baixa do Sapateiro, passando pela lembrança de que foi na Maré onde sua mãe se entendeu como um corpo político. “Eu estou muito feliz mesmo de estar aqui, e mais feliz ainda por ser na Cozinha, porque a minha mãe dizia que que política se faz com comida e com afeto. Então, a gente vai continuar fazendo política com comida e com afeto juntos”. Ainda sobre a Cozinha, a deputada estadual Renata Souza destacou o fato de ser, a própria Cozinha, fruto de política pública: construir e equipar a cozinha solidária, além de estruturá-la com alimentos para seu funcionamento, só foi possível com a conquista da Chamada Pública para Apoio a Ações Emergenciais de Enfrentamento à Covid-19 em Favelas do Rio de Janeiro, viabilizada pela Fiocruz com recursos da ALERJ. Marinete Silva, mãe de Marielle, comentou também sobre a necessidade da população de usufruir de uma política de qualidade, executada por mulheres que compreendem a realidade da cidade e que poderão ser apoiadas pelo Instituto para que possam dar continuidade ao legado de Marielle.
Joelma Sousa, mareense e uma das coordenadoras do Mapeamento Popular na Secretaria Nacional de Periferias, também ressaltou a importância de se realizar o evento num espaço que deixa legado. “Marielle me deixou um legado, o legado de comprometimento com o meu território, com as favelas e periferias, não só do Rio de Janeiro, não só da Maré. Mas hoje a minha responsabilidade e comprometimento é de transformar as favelas, periferias e comunidades de todo o Brasil”.
Sementes do território
O evento ainda contou com apresentações artísticas de diversos mareenses. Ana Julia Gama, mais conhecida como Naju Gama, poeta e slammer do Piscinão de Ramos, levou uma poesia de Beatriz Virgínia, chamada Maré Meu Quilombo. Fala sobre a convivência com a violência, a ausência de direitos e o preconceito da sociedade, frente à força e resistência da população favela. O cantor e ator Êlme Peres utilizou seu tempo de fala para apresentar um manifesto contra a violência dos agentes do Estado contra os moradores de favelas, e cobrar uma resposta do governo de por que esse tratamento acontece, assim como a resposta definitiva sobre os mandantes da morte de Marielle. Rejane Barcelos, também conhecida como Rainha do Verso, levou uma poesia inspirada em Marielle, que fala sobre a força das mulheres da favela.
Outras representações mareenses também fizeram falas no evento. Majô Pinho, do time de futebol Mariellas, falou sobre a iniciativa de iniciar um time feminino na favela e de ser, o ambiente do futebol, também um ambiente de diálogo. Lua Brainer, da Casa das Mulheres da Maré, demonstrou sua confiança de que a inclusão de mais mulheres na política institucional colabore para haver mais políticas de saúde e empregabilidade nas favelas.
O evento ainda teve falas da vereadora Mônica Cunha, das deputadas estaduais Monica Francisco e Thais Ferreira, e de mobilizadoras sociais como a conselheira tutelar Patrícia Felix, Indianarae Siqueira, Camila Moradia, Michele Lacerda e ainda Gab Van, da Marcha Trans e Travesti do Rio de Janeiro.