Um ano de Casa Resistências: espaço já acolheu 18 mulheres

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Por Ana Cristina da Silva

Em um sábado à tarde (01), dezenas de mulheres se reuniram na Vila dos Pinheiros, uma das 16 favelas da Maré. O motivo por trás desse grande encontro foi positivo: a celebração de um ano da Casa Resistências, fundada pela coletiva Resistência Lésbica da Maré em abril do ano passado. O dia contou com uma programação que se estendeu das 15h às 19h, contando com uma sessão de automassagem; roda de conversa; mesa de debate; entrega de prêmios e uma festa de encerramento. 

Com toda a programação acontecendo dentro da Casa Resistências, a tarde se iniciou com uma sessão de massagem corporal. Neste primeiro momento, as mulheres ali presentes sentaram-se em roda para ouvir Edneide Silva, do Espaço Casulo. Com a distribuição de um óleo à base de capim limão, Edneide, que também é terapeuta menstrual e fisioterapeuta Reikiana, ensinou técnicas de automassagem para alívio de estresse, ansiedade, cólica e sensação de retenção de líquidos. O momento ainda rendeu uma conversa sobre autocuidado feminino, ressaltando a importância de se identificar lugares seguros e saber lidar com más energias.  

Frascos de óleo à base de capim limão foram distribuídos para sessão de automassagem. Foto: Ana Cristina da Silva.

PAPINHO SAPATÃO

Se tratando de um evento comemorativo, a retrospectiva não poderia ficar de fora. Sendo assim, não demorou muito para que um projetor fosse ligado e as lembranças viessem à tona. Chamada de Papinho Sapatão, a roda de conversa relembrou algumas ações da coletiva, como o Mapeamento Sócio-cultural-afetivo das Lésbicas e Mulheres Bissexuais do Complexo da Maré, realizado em 2019; o projeto Construindo Afetos, que durante a pandemia produziu máscaras, entregou cestas básicas e contou com grupo terapêutico; e o Chora Mulheres na Roda, que aconteceu na Vila do João. Tendo participado deste último, Camila Felippe, coordenadora de Segurança Alimentar, lembrou que os moradores elogiaram a ação da coletiva ao ver a reunião de mulheres e diferentes instrumentos musicais na rua. “Foi muito legal porque, além da gente ter levado essa questão das mulheres lésbicas, a gente levou um outro movimento que foi o cultural, porque a Casa tem essa proposta de cultura mareense”.

Presente do início ao fim, Dayana Gusmão, fundadora da coletiva e idealizadora da Casa, falou sobre toda a proposta de coletividade ali trabalhada, ressaltando que a Casa conta com o apoio de cinco madrinhas, em especial duas delas: a vereadora do Rio, Monica Benicio e a deputada estadual Renata Souza, ambas mareenses. Feliz, Dayana ainda informou que a Casa já acolheu 18 mulheres em situação de violência. “A gente se invoca como espaço de cultura, mas a gente também é o primeiro espaço no Brasil com acolhimento para lésbicas dentro de um território de favela. Isso é muito importante pra gente”. Segundo Camila Felippe, o plano é que elas consigam acolher cada vez mais mulheres, mas uma das metas também é comprar o imóvel que, até o momento, é alugado.

Ana Paula Teixeira passou quase 3 meses na Casa Resistências. Foto: Ana Cristina da Silva.

Dentre as 18 mulheres acolhidas no espaço, uma é Ana Paula Teixeira, de 30 anos. Em conversa com o Jornal O Cidadão, a mareense que também é cofundadora da Coletiva Resistência Lésbica da Maré, contou que em uma situação inesperada recorreu ao espaço para sua própria segurança. “Eu estava numa situação meio que de risco de vida, né. Aqui pareceu um local apropriado para eu ficar em segurança sem ter que sair da favela, no caso o risco foi na própria comunidade. (…) Eu vim pra cá no dia em que sofri um acidente, aí pra poder me recuperar em segurança eu vim direto”. A moradora conta que ficou quase 3 meses na casa, onde teve apoio psicológico e acompanhamento de uma assistente social. Para ela, o sentimento é de realização, pois, de fato, se sentiu acolhida no espaço e por isso sempre o indica para mulheres em situação de necessidade.  

“O que a gente quer de fato, além da compra da casa, é que a gente receba mais visibilidade. Acho que o nosso foco principal é que as mulheres lésbicas da Maré consigam acessar a Casa, que elas entendam que essa Casa também é delas, que a gente consiga alcançar mais mulheres, mesmo que não sejam lésbicas, mas que entendam que esse espaço é sapatão. (…) A gente quer que a Casa cresça, que ela vire uma referência, principalmente no lugar onde ela está (Vila dos Pinheiros)”.

— Camila Felippe, coordenadora da coletiva.

Camila Felippe integra a coletiva desde 2019. Foto: Ana Cristina da Silva.

PRÊMIOS RECEBIDOS

Apesar da Casa Resistências ter sido inaugurada no ano passado, a Coletiva Resistência Lésbica da Maré existe desde 2016. Ao longo dessa caminhada, seus esforços não passaram despercebidos, rendendo à coletiva não só as moções honrosas de Renata Souza e Monica Benicio, como também a homenagem Antonieta Barros e o prêmio Marielle Franco de Direitos Humanos. Para somar à lista, na última segunda-feira (03), aconteceu a cerimônia da 35ª Medalha Chico Mendes de Resistência, organizada pelo Grupo Tortura Nunca Mais, onde a Resistência Lésbica da Maré foi uma das homenageadas.

A coletiva Resistência Lésbica da Maré recebeu a medalha Chico Mendes por seu trabalho de militância na Maré. Foto: Reprodução.

DEBATE E HOMENAGENS

Com o restante da programação acontecendo na laje, uma mesa de debate foi composta por Dayana Gusmão, Camila Felippe e duas das madrinhas da Casa Resistências: Flavinha Cândido e a vereadora Monica Benicio. Ressaltando a importância de ter tal representatividade, Camila Felippe pediu para que Monica, enquanto mulher lésbica, falasse sobre sua experiência na política. Ao destacar que “a política institucional expressa o máximo da pactuação da masculinidade tóxica”, a vereadora inicia uma discussão acerca dos direitos das mulheres em uma sociedade machista, citando algumas situações na Câmara dos Vereadores. Em contrapartida, algumas vitórias também foram celebradas e, com ajuda de Rayane Soares, representante da mandata da deputada Renata Souza, Flavinha Cândido falou sobre a Sala Lilás, uma sala especial da Alerj voltada para o atendimento de mulheres. “Todas as leis que a gente consegue criar dentro da nossa mandata hoje, é feita conversando com os coletivos. Isso é super importante”, disse Flavinha.

Da esquerda para a direita: Flavinha Cândido, Monica Benicio, Dayana Gusmão e Camila Felippe. Foto: Ana Cristina da Silva.

Já pela noite, a coletiva homenageou diferentes grupos e pessoas que apoiaram a Casa Resistências ao longo deste primeiro ano de atuação, como as madrinhas Maíra Garrido, Evelyn Silva, Flavinha Cândido e Grace Kelly; as deputadas Renata Souza e Dani Monteiro; a vereadora Monica Benicio e os seguintes grupos: Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (CEASM), Projeto Floresta Cidade, Redes da Maré, Casa Oxum, Pra Elas, Mariellas, Espaço Casulo, Instituto Maria e João Aleixo, Crias do Tijolinho e Instituto de Psicologia da UFF. Após a distribuição de um bolo para todos os presentes, a noite entrou em clima de festa com direito a DJ para celebrar a data. 

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