Quem Matou Marielle Franco?

Memória, Notícias, Segurança

Por Simone Lauar

Desde quarta-feira à noite, mais precisamente às 21h45, essa é uma pergunta que boa parte do mundo está se fazendo.

A vereadora do partido Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Marielle Franco, foi brutalmente morta com quatro tiros na cabeça. Ela e o motorista Anderson Gomes, que levou três tiros nas costas. Ambos foram mortos quando a vereadora voltava de um evento na Lapa sobre mulheres negras.

Desde quarta à noite, uma onda de comoção tomou conta do Rio de Janeiro e do Brasil, com fortes repercussões também no exterior. Muitas homenagens, depoimentos, choro, revolta, gritos, dor…

São tantas coisas que eu presenciei fazendo essa cobertura pelo jornal que nem sei por onde começar.

Percebia no rosto de algumas pessoas que se tinha aberto o chão debaixo de seus pés. Se sentiam fortes, porém perdidas. Uma voz, uma força, tinha se calado, e isso deixou todos órfãos.

Mas foi um pensamento breve, pois naquela quinta-feira, na Cinelândia, parecia que todos tinham o DNA de Marielle Franco.

Depoimentos que, ao mesmo tempo que eram regados de lágrimas, eram de força e luta. Todos sabiam que algo deveria ser mudado de imediato e que a justiça tinha que ser feita corretamente.

Marielle e Anderson foram velados na Câmara dos Vereadores, no segundo andar do prédio. Do lado de fora da Câmara, todos esperavam debaixo de um sol forte o corpo da amiga, da vereadora, da guerreira, e tantos outros adjetivos que ouvi naquele dia.

O primeiro depoimento que peguei foi da Flávia Marques que deixou o filho na escola para estar naquele momento prestando sua homenagem a Marielle. Flávia se disse honrada por ter votado na vereadora e ter feito parte da história dela.

Já Lorena Martins, outra entrevistada, estava chorando muito e disse que era privilegiada por ser de classe social boa e por ser branca, mas que admirava muito Marielle por lutar pelos desfavorecidos. Lorena ainda disse em prantos que a voz de Marielle vai ecoar por muito tempo através do povo.

Ao meio de tantos relatos emocionados e de lembranças boas da pessoa que Marielle era, vi muitos cartazes. Muitos diziam “Marielle Presente”, “Ontem luto, hoje luta” e “Sua morte não será em vão”.

Mas o ponto mais emocionante foi quando os corpos de Marielle e Anderdon chegaram ao local do velório. Uma grande corrente se formou e deu passagem aos caixões. Muitas pessoas gritando: “Marielle, presente!”, “Anderson, presente!”. Muitas pessoas se abraçando, chorando muito…  Uma dor sem fim.

Por que a morte de Marielle causou essa reação nas pessoas? Afinal de contas, morrem pessoas assassinadas no nosso estado todos os dias.

Mas a diferença é que ela fez a diferença. Uma mulher humilde que saiu daqui da Maré. Estudou, se formou, e entrou para a política depois que uma grande amiga foi assassinada por uma bala perdida num confronto aqui na favela.

Ela se filiou ao PSOL,  se candidatou e foi a quinta vereadora mais votada no Rio de Janeiro em 2016.

Marielle era ativista dos direitos humanos, ajudava família de policiais assassinados; era negra, era lésbica, era feminista, era mãe, e era da Maré.

Por isso toda essa comoção, porque ela era muita coisa! E quando eu digo muita coisa, são coisas boas.

Sua voz agora ecoa pelo mundo: por Londres,  por Portugal, por Nova Iorque,  pela Argentina…. O mundo quer saber quem matou essa pessoa e foi calada dessa forma.

Desculpem esse tom tão pessoal do meu texto, mas eu acho que as pessoas estão cansadas de relatos jornalísticos frios. Eu estive lá,  eu vivenciei e captei toda aquela emoção. Difícil ser somente jornalista numa hora dessas.

Você que tá lendo sabe o quanto dói ver uma mãe gritando ao ver o caixão da filha, um povo por ter perdido a única voz e uma viúva inconsolável que perdeu o seu porto seguro?

Nesse texto não quis colocar estatísticas, fatos ou achados, quero colocar em linhas a emoção dessas pessoas que falaram comigo e das que olhei sem chegar perto, pois a emoção era muito grande.

Calaram a líder das minorias, calaram a líder de uma parte da população que precisava de uma voz.

Marielle e Anderson foram velados somente pela família  e alguns amigos e eu estava lá. Pois eu a conheci na minha primeira cobertura pro jornal O Cidadão e depois disso falavámos pelas redes sociais. Recebia convites de suas palestras, inclusive, recebi o convite da sua última palestra. Não pude ir, só pude me despedir.

Depois que seus corpos saíram da Câmara dos Vereadores, eles foram enterrados e houve uma grande manifestação às 17h. Muitas homenagens e discursos que foram transmitidos nos noticiários praticamente de todo o mundo.

A líder que virou semente mobilizou as mulheres do mundo. E dá pra sentir que, desta vez, essas mortes não foram em vão.

Enfim, a vida segue, a voz ecoa, a luta continua.

Fotos de Simone Lauar:

 

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