Páscoa impulsiona vendas de confeiteiras na favela

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Entrevistas por Ana Cristina da Silva e Carolina Vaz

Texto e foto da capa por Ana Cristina da Silva

Pegando muitos mareenses de surpresa, este ano a Páscoa será celebrada no dia 31 de março e não em abril, como muitos acreditavam. Acontece que a data muda de acordo com o calendário católico, que se baseia nas fases da lua. Vindo logo após o Carnaval e ainda no final do mês, época em que o dinheiro já é pouco para muitos, os desafios de se comprar chocolates surgiram não só para aqueles que vão presentear alguém, como também para aqueles que produzem e vendem estes doces na Maré. Na Nova Holanda, Taymara Santos trabalha como confeiteira e se preocupa com possíveis encomendas feitas em cima da hora. No Pinheiro, Lucineide Madeira Rosa, que aproveita a Páscoa para ter uma renda extra, se questiona se as vendas serão mais fracas por conta da data cair no final do mês.

Com os preços cada vez mais altos, muitas pessoas passam a perder o interesse das caixas de bombom e dos ovos de Páscoa tradicionais do mercado. Seus olhares se voltam para as diferentes e coloridas produções artesanais, vendidas muitas das vezes por pessoas que buscavam renda extra e aprenderam sozinhas a arte da confeitaria. Tanto Taymara quanto Lucineide se encaixam nesse contexto.

Taymara Santos pega ideias do seu próprio cardápio para criar recheios para ovos e barras de Páscoa. Foto: Ana Cristina da Silva.

Taymara Santos — Nova Holanda

Antes da pandemia Taymara Santos da Silva tinha um pequeno salão onde trabalhava como manicure, mas com tudo parado na quarentena a moradora da Nova Holanda teve que pensar em outra forma de ajudar o marido a manter a família financeiramente. O que mudou o rumo das coisas foi algo bem simples: Taymara adorava fazer doces sem compromisso porque havia crescido vendo a mãe e as tias trabalhando com isso, tendo aprendido muito só de observar. “Aí quando veio a pandemia eu fiquei sem poder trabalhar e minha amiga me deu a ideia, né. ‘Por que não faz os doces que você faz em casa pra vender?’, aí eu fiz e estourou”, conta a mareense de 33 anos.

“Nunca fiz curso nenhum. Eu fui estudando na internet mesmo, olhando, me aprimorando, e é uma coisa que eu gosto de fazer. Então quando a gente trabalha com aquilo que a gente gosta, a gente faz tudo bem melhor”.

— Taymara Santos

Em maio completa 4 anos desde que Taymara arriscou tudo na venda de doces. Sua antiga casa na rua Carlos Lacerda hoje é sua confeitaria, conhecida como “Gostosuras da Tay”. Neste local ela prepara, armazena e vende doces e salgados de diferentes tipos. “No começo eu fazia os doces, eu atendia, eu fazia entrega, eu fazia tudo sozinha. Agora eu tenho a minha irmã aqui me ajudando e também tenho entregador. Eu entrego pra toda a Maré e uns bairros fora também”. Dentro de todo o extenso cardápio que tem, a moradora da Nova Holanda não deixa de destacar os mais pedidos pelos clientes. Na parte dos salgados os líderes de venda são os empadões e a coxinha de frango, já nos doces quem sai na frente são os bolos gelados e os brownies.

Taymara trabalha a quatro anos vendendo doces e salgados e 3 anos produzindo ovos de páscoa artesanais. Foto: Ana Cristina da Silva.

Foi no ano de 2021 que Taymara resolveu investir na Páscoa, mas preocupada com a falta de experiência, naquele ano preparou ovos de páscoa no pote, algo mais parecido com os doces que ela já vendia. Este ano, além de ter ovos de colher, ela também vende barras de chocolate e mini ovinhos. Quanto aos recheios, eles são diversos, já que ela se inspira nos doces do cardápio para fazer suas criações de Páscoa. “Esse ano eu fiz o Caribe que muita gente tava me pedindo e eu nunca tinha feito. O mais novo que eu fiz também esse ano foi o ovo de afogadinho de brownie, de ninho com Nutella. Porque é um doce do cardápio que sai bastante aqui. Eu pego essas ideias assim, o doce que mais sai eu vou e coloco no ovo”, explica.

Lucineide Madeira — Pinheiro

Diferente de Taymara, que trabalha integralmente com a venda de doces e salgados, Lucineide Madeira, de 57 anos, aproveita a Páscoa para conseguir uma renda extra. Em uma pequena casa na Travessa 21 da Via Seletiva, moram ela e a filha Yasmin de 13 anos, que tem síndrome de Gilbert, uma doença genética que faz com que o fígado não processe adequadamente uma substância chamada bilirrubina. Lucineide conta com o dinheiro do BPC-LOAS (Benefício de Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social), de Yasmin e ainda com a pensão paga pelo avô paterno da menina. Precisando estar a todo momento com a filha, Lucineide se vê impossibilitada de sair para trabalhar e por isso faz serviços autônomos ao longo do ano, como a venda de chocolates na Páscoa.

Lucineide Madeira prepara os ovos na própria casa, no Pinheiro. Foto: Ana Cristina da Silva.

Quando sua mãe era viva, Lucineide costumava fazer bolos para ela. Então tudo o que faz hoje, aprendeu na prática, sem curso algum. “Eu tenho muita vontade de fazer. Eu já me inscrevi em vários cursos gratuitos, até no Senac que era um dia só. Mas meu filho é técnico de enfermagem, ele trabalha um dia sim um dia não, ele que fica com ela (Yasmin) pra mim, e no dia que caiu o curso ele estava trabalhando. Mas não posso desistir, um dia eu faço”. Aprendendo com as dicas vistas em canais do Youtube, a moradora do Pinheiro começou a fazer ovos de Páscoa e hoje, em seu terceiro ano, ela traz mais novidades.

Com pelo menos 3 tamanhos diferentes de ovos de páscoa, Lucineide produz desde ovos mais simples com apenas a casca, até aqueles trufados com recheios de brigadeiro, beijinho, mousse de maracujá e ninho com óreo. Pensando nas crianças, ela faz alguns ovos que contêm pequenos brindes em seu interior, como brinquedinhos ou balas Fini. Este ano, ela adicionou também à venda um chocolate em formato de controle de videogame que é completamente recheado e ainda é decorado com confetes. Para mentes mais criativas, ela também vende uma caixa que contém o ovo, o recheio e os confetes separados, na intenção de incentivar o comprador a montar o seu próprio ovo de colher.

Uma das novidades que Lucineide trouxe este ano foi o controle de videogame de chocolate recheado. Foto: Ana Cristina da Silva.

São muitos os desafios, Lucineide só consegue produzir suas encomendas no período da noite, após colocar Yasmin para dormir. Tendo apenas o espaço pequeno da cozinha, ela prepara tudo o que consegue e vai dormir, sabendo que irá levantar em poucas horas para cuidar da filha. Porém, além do cansaço, a preocupação também vai para o armazenamento: “O mais desafiador é você fazer os ovos e não ter onde armazenar. Eu praticamente desocupei a gaveta da geladeira para poder armazenar. É o espaço, mesmo que eu quisesse colocar uma geladeira maior não ia ter onde”, conta a moradora do Pinheiro.

Empreendedoras da Maré

No final do dia, Taymara e Lucineide atuam de formas bem diferentes, mas ambas são empreendedoras mareenses que trabalham intensamente em época de Páscoa. Ambos os trabalhos são feitos com carinho e cuidado, prezando pela qualidade daquilo que está sendo feito, e lutando contra o preconceito que muita gente ainda tem.

“É difícil, porque nem sempre as pessoas que estão dentro da comunidade conseguem olhar a gente como eles veem outros empreendedores que moram fora. Não é a maioria, mas uma boa parte não consegue respeitar ou ter empatia com o nosso trabalho, eu trabalho com público e eu sei muito bem. Algumas pessoas respeitam, valorizam e outras não, só porque é dentro de comunidade, então eles acham que aqui tem que ser de qualquer jeito”.

— Taymara Santos.

Porém, a batalha também vem na divulgação e na busca por clientela em um bairro tão carregado de empreendedores. Lucineide divulga principalmente pelo WhatsApp, mas também publica algumas coisas em seu Instagram pessoal. Já Taymara, que trabalha o ano todo com a venda de doces, atende pelo WhatsApp e possui uma conta comercial onde posta fotos que ela mesmo faz, divulgando todo o seu trabalho.

Para acompanhar o trabalho destas duas empreendedoras e realizar encomendas acesse o Instagram nos seguintes perfis:

@goostosurasdatay

@lucineidemadeira

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