Territórios Silenciados: novo livro traz pesquisas de mareenses

Educação, Geral, Memória

Por Carolina Vaz

Colaboração de Jessica Coccoli

Na foto de capa, da esquerda para a direita: Alexandre Dias, Filipi Gradim, Marcleivson Nascimento, Lourenço Cezar, Luiz Lourenço, Angela Santos, Diogo Nascimento, Aline Botelho, Tatiana Fuly e Marcelo Sales. Foto de Jessica Coccoli.

Identidade territorial, evasão em pré-vestibulares populares, trajetória de escritoras pretas periféricas: esses são alguns temas do livro Territórios Silenciados, da editora Rubi, lançado no último sábado (08) na Lapa. Com organização dos mareenses Lourenço Cezar e Diogo Nascimento, o livro traz sete textos de pesquisadores da Maré, Honório Gurgel e de cidades da Baixada Fluminense.

Protagonismo na pesquisa

O lançamento reuniu, além dos autores pesquisadores, parentes, colegas, amigos e outros interessados nessa obra pensada especificamente para mostrar a produção científica de pesquisadores periféricos, falando a partir de seus locais de origem e de vivência. Diogo Nascimento, pedagogo e doutor em Estudos do Lazer, explicou que o título Territórios Silenciados é justamente para mostrar esses silêncios que ficam sobre os territórios abordados no livro, e romper com ele a partir de olhares de dentro. Foi complementado pelo geógrafo Lourenço Cezar, doutorando em Serviço Social e também organizador da obra: “Muitos pesquisadores fizeram trabalhos maravilhosos sobre periferia, mas agora é a vez também de a gente mostrar o que a gente pensa sobre nós. É mais uma luz, mais uma forma de pensar o mundo a partir do local”.

Amigos do CPV/CEASM foram prestigiar o trabalho dos colegas. Foto: Carolina Vaz

Ter protagonismo para falar da própria realidade é um dos pontos principais para a pedagoga Tatiana Fuly, co-autora do artigo “O entrelaçar da trajetória de mulheres pretas: escrevivências periféricas e seus percursos”. Em sua fala, ela destacou a possibilidade romper com o silenciamento de mulheres periféricas, para que possam falar sobre o espaço que criaram, espaço onde nasceram e onde mobilizam outras mulheres para romper barreiras: “A gente passou 550 anos de Brasil ouvindo brancos falarem a respeito da mestiçagem, a respeito do pardismo, do colorismo, da negritude, do povo indígena, e a gente não tinha outra história pra contar, e essas falas constavam no livro de história. Mas hoje a gente sabe que história a gente pode contar”.

Outro ponto abordado sobre essa atitude de falar sobre o território foi o de legitimar algo muitas vezes banalizado pela Academia, que é a pesquisadora ou pesquisador partir das próprias motivações, das suas experiências e sua identidade. Luiz Lourenço, geógrafo e mestrando em ordenamento territorial, fez esse destaque no lançamento: “Cada pessoa que está aqui tem suas experiências e está escrito aqui também com tintas da subjetividade. Não é só uma escrita técnica, são as nossas experiências colocadas em formato de texto, e eu acho muito legal a gente poder compartilhar essas experiências que não vêm do centro, que vêm da periferia, e falar através de várias linguagns diferentes”. Com a presença de dezenas de amigos e admiradores na tarde de sábado, o fator coletivo das pesquisas foi destacado por Angela Santos, formada em Matemática e mestra em Tecnologias para o Desenvolvimento Social.

Angela Santos destacou a presença de colegas que fizeram parte de sua pesquisa. Foto: Jessica Coccoli.

“O meu trabalho de fato foi construído coletivamente, aqui eu tenho diversos companheiros de luta que ajudaram nesse processo da escrita, da pesquisa, do estudo de caso. Eu trabalhei e trabalho no pré-vestibular comunitário do CEASM, e o meu trabalho é sobre evasão. Que quer dizer o quê? A gente tem que criar estratégias pra permanecer nos lugares onde a gente quer estar. Na educação, na política, onde quer que seja”.

Angela Santos
Um projeto para dar visibilidade a pesquisadores periféricos

Segundo Lourenço Cezar, o livro é consequência de um projeto que ele e Diogo Nascimento iniciaram na faculdade Fioduc, em Duque de Caxias mas que já não existe, em que eles tiveram contato com estudantes com poucas perspectivas de futuro, sem motivação sequer para tentar o ENEM, que eles começaram a levar para conhecer espaços culturais e até outros municípios. “Esse projeto também nasce com uma ideia, que a gente já discute no CEASM há muito tempo, que é de produzir conhecimento a partir do local. Então é trazer pessoas que estão estudando, estão pesquisando mas às vezes a pesquisa vai cair numa prateleira da faculdade e ninguém vai ver. A gente achou que esse era um espaço onde as pessoas poderiam colocar seu material”, ele conta. Assim, todos os pesquisadores se reuniram para tornar o livro realidade. E, segundo Lourenço, a ideia é que se crie um repositório de trabalhos de pesquisadores de periferia, como um site com redes sociais, onde seja possível também fazer contato com esses autores e autoras.

Da esquerda para a direita: Lourenço Cezar, Angela Santos e Luiz Lourenço, respectivamente diretor e educadores do CEASM. Foto: Jessica Coccoli.

Territórios Silenciados está à venda pelos sites da Editora Rubi e Americanas.com.

Confira a relação de artigos presentes:

Capítulo 1 – Projeto Experiências: a dor e delícia de ser universitário na Baixada Fluminense – Diogo Nascimento e Lourenço Cezar

Capítulo 2 – O entrelaçar da trajetória de mulheres pretas: escrevivências periféricas e seus percursos – Aline Botelho, Tatiana Fuly e Mayara Barbosa Santos da Silva

Capítulo 3 – Caminhos para o enfrentamento da evasão em pré-vestibulares populares e outros espaços de educação – Angela Santos

Capítulo 4 – Identidade territorial: caminhando entre o mapa, o censo e o museu – Luiz Lourenço

Capítulo 5 – A civil desobediência dos bailes: resistência suburbana no movimento Black Rio – Filipi Gradim

Capítulo 6 – Belford Roxo – o local mais violento do mundo – a fake news que estigmatizou a cidade – Marcelo Ribeiro Sales e Marcleivson Silva do Nascimento

Capítulo 7 – Projetos, processos, negociações e conflitos: um estudo sobre a ocupação e a formação do bairro Maré – Alexandre Dias

Comentários